quinta-feira, 12 de julho de 2007

Dois séculos depois...

Li recentemente um interessante texto de Michel Foucault chamado O Nascimento do Hospital. Nele o autor conta que "a consciência de que o hospital pode e deve ser instrumento destinado a curar aparece claramente em torno de 1780". Apesar de registrarem-se a existência de instituições hospitalares já no século V a.C.

Anteriormente o hospital servia mais como um depósito de doentes, que deveriam ser afastados da sociedade para protegê-la do contágio de doenças e de contato com seus miasmas. Obviamente, confinados em condições insalubres, esses doentes tornavam-se mais doentes e acabavam morrendo, confortados, na maioria das vezes, por religiosos preocupados em ganhar a vida eterna através de imensa caridade.

Espelho dessa vocação hospitalar anterior ao século XVIII é o surgimento da Ordem Camiliana em 1591, tamanho era o comprometimento de Camilo de Lellis com os doentes que os religiosos camilianos além dos votos tradicionais na Igreja Católica de pobreza, obediência e castidade, precisam fazer um quarto voto, o de não abandonar os doentes mesmo que sob intenso risco de adquirir doenças mortais (na época a mais temida era a peste).

Em 1870 apenas o hospital foi medicalizado, até então a atividade médica não ocorria dentro dos hospitais. Essa medicalização surgiu, segundo Foucault, nos hospitais militares e teve essencialmente um cunho econômico, não era mais aceitável perder-se militares treinados.

O hospital deixa de ter o objetivo de isolamento e conforto para a morte e passa a ser um local de cura. Há mais de um século, Florence Nigthtingale, afirmava que no ano 2000 começaríamos a pensar em retirar os doentes do hospital e cuidar deles em suas próprias casas.

Florence foi visionária, hoje isso realmente acontece, cresce a tendência a desospitalizar os pacientes e tratá-los em suas próprias casas ou em hospices. Hoje o hospital está sendo vocacionado ao tratamento de pacientes graves as UTIs tomam cada vez mais espaço dentro dos hospitais.

Como disse em artigos anteriores, apenas em 1999 com a publicação de "To Err is Human" é que tomamos consciência de que o hospital continua causando muito dano aos pacientes. O interessante é que passaram-se mais de 200 anos da constatação de que isso acontecia nos hospitais medievais e renascentistas para constatarmos que continua acontecendo nos nossos hospitais no dia de hoje.

A cada dia que passa, convenço-me mais da necessidade de uma revolução na saúde. Talvez refazer a revolução ocorrida no século XVIII.

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